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Brasil pode se afirmar como ‘potência verde’ mundial no cenário de guerra da Ucrânia

Pozsar, que já passou pelo banco central e pelo Tesouro americanos, além do Fundo Monetário Internacional, disse que esta nova ordem colocaria em xeque o papel do dólar e do euro nas transações internacionais.

 

A segunda predição, expressa na carta anual de Larry Fink, CEO do BlackRock, foi a de que a globalização, tal como a conhecemos hoje, não resistirá à guerra na Ucrânia.

 

O historiador econômico britânico Adam Tooze não se deixou impressionar por nenhum dos dois. Diretor do Instituto Europeu da Universidade Columbia, em Nova York, ex-professor da Universidade de Cambridge e de Yale e autor de abrangentes ensaios sobre a economia nazista (“The Wages of Destruction – The Making and Breaking of the Nazi Economy”, Viking, 2006), a crise financeira de 2008 (“Crashed: How a Decade of Financial Crisis Changed the World”, Viking, 2018) e a pandemia (“Portas fechadas”, Todavia, 2021), o único traduzido no Brasil, já se debruçou o suficiente sobre movimentos tectônicos da economia mundial para reconhecê-los.

 

Nesta entrevista ao Valor, o professor diz que a pandemia foi um choque muito mais substancioso do que a guerra porque atingiu o mundo inteiro e provocou um impacto visível e generalizado no comércio global. Tooze vê, sim, uma crise política global, com repercussões sobre a economia. Diz, porém, que as tentativas do presidente americano, Joe Biden, de alinhar a política de segurança a uma política comercial na Ásia fracassarão.

 

Tooze ainda diz que o Brasil não deve abrir mão dos fertilizantes da Rússia pela mesma razão pela qual os europeus não dispensam seu gás. Mas pondera que o país deve intensificar o desenvolvimento de matrizes energéticas que reduzam sua dependência de combustíveis fósseis, não apenas para produzir fertilizantes, mas para se efetivar como “potência verde” mundial.

 

Tooze diz ainda que os programas de renda dos governos Lula e Bolsonaro mostraram que o Brasil não está condenado a ficar prisioneiro da desigualdade e que a armadilha fiscal deve ser enfrentada com a revisão da estrutura tributária do país.

 

No intervalo das aulas, dos livros, da análise semanal do noticiário econômico internacional, “Chartbeat”, publicada no seu Twitter, e do podcast “Ones&Tooze”, que mantém com o editor da “Foreign Policy”, Cameron Abadi, o historiador britânico conversou com o Valor, por chamada de vídeo, a partir de sua casa, em Manhattan:

 

“Se o Brasil precisa de fertilizantes, deve usar exatamente o mesmo argumento que a Europa usa. Não vamos nos punir para poder punir a Rússia”

Valor: Em carta aos acionistas, Larry Fink, CEO da BlackRock, disse que a globalização, como a conhecemos, acabou. O senhor concorda?

 

Adam Tooze: Era uma das notícias mais lidas do “Financial Times” hoje cedo. Fui ler na expectativa de aprender algo.

 

Valor: E aprendeu?

 

Tooze: Não. Fiquei frustrado, devo confessar. A manchete do FT foi: “Guerra marca o fim da globalização”, mas o que Larry Fink falou foi que a invasão da Ucrânia pôs fim à globalização que temos experimentado nas últimas três décadas. E que as cadeias de suprimento vão mudar e, provavelmente, terão uma ênfase mais doméstica, mas isso não significa que ele pense que Estados Unidos, México ou Brasil se beneficiarão disso. Ele, na verdade, tem uma ideia muito vaga do que pode acontecer, como todo mundo.

 

O que é claro é que há uma crise na política global. Washington agora tem que decidir se está lidando com um problema de delinquência ou com uma guerra fria. A Rússia é um Estado vilão ou forma com a China uma unidade ideologicamente compacta no estilo União Soviética na competição de poder? Fim da globalização me parece uma descrição pouco precisa e razoável. O Brasil, por exemplo, se beneficia no momento de um extraordinário boom de commodities. E não há, no momento, um modelo alternativo para o Brasil desenvolver seus setores exportadores. A direção desses fluxos vai continuar a ser determinada por uma economia crescentemente multipolar. E isso vale tanto para um país de alta renda como a China quanto para um país de baixa renda como o Egito, que continuam a consumir os grãos ucranianos e o trigo russo.

 

A guerra, na sua origem, é um problema do século XIX: um conflito armado que repercute nas commodities. Não é o fim da globalização. A pandemia foi um choque global muito mais substancioso. Atingiu o mundo inteiro e provocou impacto generalizado no comércio global com o mergulho das commodities. Agora a subida dos preços atrai produtores que estão à margem do comércio global. Se você conversar com pessoas do governo Biden sobre comércio, vai perceber que livre acesso a mercados é um assunto que evitam. O fim da globalização é, basicamente, uma discussão mais relacionada aos interesses representados no Capitólio do que à Ucrânia.

 

Valor: O protecionismo ficou muito caro para ser ressuscitado?

 

Tooze: Sim. O governo Biden quer alinhar a política de segurança a uma política comercial na Ásia, mas isso não funciona. Japão e Coreia do Sul querem a retaguarda de segurança americana, mas não querem escolher entre China e EUA para fazer comércio. Há enormes investimentos e relações comerciais entre essas economias, maiores do que com os EUA proporcionalmente. [Vladimir] Putin pode ser capaz de produzir uma frente de guerra fria na Europa, mas na hora que essa frente chegar aos Himalaias, já estará desintegrada. Isso não significa que Pequim esteja inexoravelmente aliada a Moscou na Ucrânia. Não está. A China está abrindo espaço para um debate público sobre a guerra da Ucrânia. Deixar que os chineses cheguem a suas próprias conclusões é uma indicação de como se conduz. A Europa é que investe numa nova cortina de ferro. Mas não acho que esse seja um modelo para a América Latina. Há uma tentativa de coação sobre o Brasil, mas é difícil imaginar o país tendo que tomar lado.

 

Valor: As reservas internacionais da Rússia enfrentam um bloqueio severo, mas a Europa não foi capaz de cortar sua demanda do gás russo. Como o senhor avalia as sanções até aqui?

 

Tooze: A política de sanções foi adotada sem que se previsse o que acontece hoje. O “smart money” [investimento de curto prazo] saiu da Rússia antes da invasão. Esperava-se que a Ucrânia colapsasse e a Rússia dominasse rapidamente. Ao primeiro choque, que foi a invasão, veio o segundo, que foi a resistência ucraniana. E as sanções foram adotadas enquanto a Ucrânia resiste. E aí temos o [Volodymyr] Zelensky na TV: “Estamos nós resistindo sozinhos pelo mundo livre enquanto a Europa ameaça parar de comprar o gás russo”. Esta situação não estava contemplada. Seria mais fácil se a Rússia tivesse tomado o controle porque se repetiria o cenário da Crimeia. No lugar disso se está fazendo das sanções uma dramática guerra econômica. Vai funcionar? Não está claro. Deteve a Rússia? Não. Impediu a Rússia de guerrear? Não. Prejudicou a Rússia? Sim.

 

Tinham a intenção de prejudicar o país, anunciaram as sanções e levaram a cabo de maneira consistente. Mas acontece que o Ocidente não quer pagar preço tão alto pelas sanções. Do ponto de vista da eficácia, de fazer mudar a decisão de Putin, as sanções foram ambiciosas demais. A maior parte do prejuízo da Rússia é colateral, não é um efeito direto das sanções. Não se sanciona o trigo russo, por exemplo, diretamente. Mas o fato de haver uma guerra dificulta as exportações. O mesmo com a energia. O fornecimento continua, mas o preço sobe. É um efeito que extrapola as sanções oficiais.

 

O mesmo com as sanções corporativas. A British Petroleum considerou que continuar a comprar petróleo da Rosnet poderia causar um custo reputacional muito grande. Foi um efeito colateral das sanções sobre o mundo corporativo. Mediu-se o quanto se precisaria ir nas sanções para ter efeito nos humores do mercado ocidental. O efeito nas expectativas e nos sentimentos. Era isso que se queria.

 

Valor: O economista do Credit Suisse Zoltan Pozsar disse que se assiste ao surgimento de um Bretton Woods III. E que essa nova ordem enfraquecerá o dólar e o euro. O senhor concorda?

 

Tooze: Não entendi por que Zoltan entrou nessa. Extrapolou. O que se vê é a força do sistema formado pelo dólar e pelo euro, e talvez seja preciso acrescentar o iene. EUA, Reino Unido e Japão respondem por mais de 85% da gestão de ativos seguros. Se você tem trilhões de dólares para investir, ou seja, se você é a China, não há nada para comprar que não seja expresso nessas três moedas. Se você decidir investir uma parte em outro ativo, você vai explodir o preço desse ativo. Não tem um substituto. Você pode fazer uma transação em yuan com a China, mas depois vai trocar para uma dessas moedas mais conversíveis. O argumento de Zoltan é o de que se vai precisar de um novo sistema porque a China não vai querer mais participar daquele que aí está. É como se dissesse que o carro atingiu um quebra-mola e agora é preciso subir o Everest. Não, você não precisa escalar o Everest. Apenas reconheça que o quebra-mola impõe um limite de velocidade.

 

Essa coisa funcionalista de que a existência de um problema obriga à mudança de toda a estrutura não faz sentido. A China não vai tomar a decisão de invadir ou não invadir Taiwan em função de suas reservas em dólar. Os grandes acontecimentos da história não foram constrangidos pela moeda. O técnico pode até perguntar: “O que vamos fazer com nossas reservas?”. Ele vai ouvir: “Vá lá e resolva o problema. É para isso que você está aqui. Estou fazendo história aqui, não tecnologia”.

 

Valor: É uma crise política e a economia vai se adaptar, então?

 

Tooze: Sim, produzimos essa grande frente financeira contra Putin, que comandou uma invasão a um país soberano vizinho. Arrisca repetir a guerra da Crimeia. Sabe o que aconteceu naquela época? A presidente do Banco Central da Rússia [Elvira Nabiullina] ganhou não apenas uma, mas duas vezes o prêmio [do FMI] pela gestão do melhor banco central do mundo.

 

“O futuro do Brasil é se tornar uma potência verde. O Brasil tem a Amazônia. Tem que se achar meios de monetizá-la”

Valor: Foi da crise em que a Rússia afundou nos anos 1990, depois da queda do muro, que surgiu Putin. O que esta crise produzirá?

 

Tooze: Os fundamentos da ação do Ocidente, dada a dificuldade de se conseguir um acordo de paz com a Rússia, são a expectativa de Putin desaparecer, evacuar, ser removido pelos russos [horas depois, Biden diria na Polônia que Putin deveria ser removido]. Mas o fato é que ninguém sabe o que virá. Não se sabe o quanto a oposição russa radicalizaria o regime, a ponto de provocar um Putin 2.0. Quando ouço sobre crise na cadeia de comando russo, dissenso na FSB, conflito entre Putin e os generais, fico tão apreensivo quanto esperançoso. Em função do arsenal nuclear russo, a ideia de uma cadeia de comando enfraquecida e luta interna pelo poder no Kremlin contém uma ameaça potencial e uma chance de paz.

 

Valor: O Ocidente apostou demais na pressão sobre os oligarcas? Não lhe parece que os oligarcas dependem mais de Putin do que o inverso?

 

Tooze: Sim, mas os formuladores ocidentais sabiam disso. Atingir os oligarcas foi uma medida populista e alimentada pela russofobia. Não imagino que se tenha apostado que isso mudaria a política do Kremlin porque, sim, eles dependem mais de Putin do que o inverso. E isso tem sido assim por mais de 20 anos. A luta pelo poder se agudizou em 2003 e se resolveu favoravelmente a Putin. Isso não significa que a relação seja distante. Eles conversam, têm a liberdade de criticar Putin diretamente e reclamar das más notícias que ele traz para seus negócios. Mas conversam sobre economia, não sobre geopolítica. Isso não se discute mais. Putin lhes disse: “Vão ganhar dinheiro, expandir seus negócios. Isso é o que vocês sabem fazer. Não cruzem a linha”. Ele é o senhor da geopolítica. Nos anos 1990, era um burocrata da economia, mas quando ascendeu ao poder deixou a economia com os economistas. O determinante é a disputa militar e geopolítica.

 

Valor: Que impacto terá a reação do Ocidente à Rússia para seu relacionamento com o mundo islâmico?

 

Tooze:A Rússia tem seus próprios problemas com o radicalismo islâmico. A começar pela Chechênia. Na Síria, Putin proveu Bashar al-Assad com recursos para derrotá-los. Mas a Rússia também tem parceiros importantes no mundo islâmico. Quem visitou Putin no primeiro dia da invasão foi Arif Alvi, presidente do Paquistão. A Rússia também é um pivô crucial na negociação do Irã. São vizinhos e têm uma longa relação. A Rússia é a grande retaguarda do regime de Assad. E a política do petróleo, neste momento, está sob a influência da Opec + [bloco de 23 países que controlam o preço do petróleo], e a Rússia tem relações muito próximas de dois de seus principais membros, Arábia Saudita e Emirados Árabes. Sempre se pensou nos Emirados como um país muito próximo dos EUA, mas o país se absteve na ONU. Tanto os Emirados quanto a Arábia Saudita são inimigos do radicalismo islâmico. A mesma lógica pode ser aplicada na relação da Rússia com o Egito e com os demais países do mundo islâmico.

 

Então a resposta é que a guerra pode, sim, redefinir as relações da Rússia na região, mas em prejuízo do islamismo radical. A religião não é um fator determinante aqui. Determinante é o realinhamento geopolítico e a centralidade da energia. A Rússia tem fortes relações com Síria, Paquistão, Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes, países que não se relacionam bem entre si, mas que se relacionam bem com os russos. A Rússia é um ator político mais importante na relação com esses países do que a China. E a atuação de Putin nessa triangulação Irã, Emirados Árabes e Arábia Saudita é muito bem compreendida em Washington. O poder da Rússia nessa relação cresceu muito em relação àquele dos EUA na última década

 

Valor: Em “Portas fechadas”, o senhor disse que a pandemia aumentou as desigualdades entre os países. A guerra as ampliará?

 

Tooze: Sim, por causa da loteria das commodities. Muito depende do quanto se é exportador ou importador de commodities. Depende se você é muito endividado ou não. No ano passado nos preocupamos com a situação do Brasil. Houve muita discussão nos EUA sobre a possibilidade de uma crise financeira no Brasil. Em função da renda das exportações, que cresceu, essa não é mais uma preocupação hoje.

 

Mas, de fato, há um preocupação crescente com os países de baixa renda que têm uma dívida pesada e são países importadores de petróleo. Internamente, o preço da energia e das commodities também vai afetar os mais pobres. Os ricos podem até se endividar mais porque têm casas maiores e ar-condicionado, mas no fim eles absorvem o impacto e não vão deixar de usar seu ar-condicionado. Mas, se as cadeias de suprimento são interrompidas porque os produtores de commodities não podem financiar o transporte, haverá países em que os mais pobres não terão saída senão perder renda. É decorrência do impacto sobre as duas âncoras do consumo: energia e comida.

 

Valor: O senhor escreveu recentemente que na crise do petróleo dos anos 1970 as economias estavam mais indexadas. Sem o mesmo grau de indexação, pela fragilidade, por exemplo, dos sindicatos, as desigualdades sociais vão aumentar?

 

Tooze: Sim. O que temos experimentado é choque de preços sem forças que os equilibrem. A dúvida é se o conflito social vai aumentar. Se isso resultará num impacto severo sobre o padrão de vida dos mais pobres. Os bancos centrais estão mais relaxados porque os indexadores estão mais fracos, os salários não subirão junto com os preços, mas do ponto de vista da igualdade e do equilíbrio social é uma experiência dramática. E talvez seja preciso usar formas de subsídio estatal para evitar que sejam muito atingidos. Responde a uma demanda social, mas vem do parlamento e do executivo, e não dos sindicatos e mobilizações. São uma expressão da desigualdade do poder. O que dizem é: “Fiquem quietos em suas favelas. Daremos o que precisam”. São políticas que desmobilizam. Mas é melhor que nada. Quando um conservador expressa sua preocupação, ou ele está preocupado com a inflação em si ou com a pressão social que virá. Geralmente é com o segundo. A Primavera Árabe foi desencadeada, em grande parte, por inflação de alimentos.

 

Valor: O Brasil votou pela condenação da Rússia nas Nações Unidas, contrariando o Brics, mas o governo tem uma política ambígua em relação a Putin. O país tem ainda uma dependência importante dos fertilizantes russos. Como o Brasil será afetado pelos desdobramentos da guerra?

 

Tooze: O Brasil não deve ter medo de equilibrar as pressões. Não há qualquer cenário sério que leve em consideração qualquer sanção de Washington. Os EUA têm 99 outros problemas para resolver antes de brigar com o Brasil. É claro que há fundamentos morais e do direito internacional para um país independente e soberano como o Brasil condenar a invasão russa, mas o Brasil, assim como a Índia, não devem admitir chantagem. Se o Brasil precisa de fertilizantes, deve usar exatamente o mesmo argumento que a Europa usa. Nós precisamos e devemos ter o direito de comprar fertilizantes. Não vamos nos punir para poder punir a Rússia.

 

É um momento crítico para o desenvolvimento do Brasil. O país está ainda na margem de problemas financeiros. Tem um boom de commodities em curso e o Brasil deve tirar vantagem desse momento. E fazê-lo com políticas domésticas adequadas para que não se transforme apenas num extrativismo predatório, mas com efeito multiplicador para a economia. Engajar-se numa suposta frente ocidental contra a Rússia não deve ser a prioridade. Essa frente é muito retórica e sem substância. Se os europeus reagirem, a saída mais construtiva seria dizer que o Brasil quer a mesma parceria em energia que a Europa acabou de anunciar com os EUA para assegurar a sustentabilidade de nossa agropecuária. Dito isso, ter um setor agropecuário fortemente baseado em fertilizantes dependentes de combustíveis fósseis não é bom. O futuro do Brasil é se tornar uma potência verde. O Brasil tem a Amazônia, reserva ecológica fundamental para a humanidade. Tem que se achar meios de monetizá-la. Então, ao invés de adotar uma postura à la Bolsonaro do tipo “soberania acima de tudo”, o foco deveria ser o seguinte: “Olha, temos um grande problema, vocês e nós, por que não conversamos para chegar a uma solução para este problema?”.

 

Valor: Se as expectativas em torno desta “potência verde” fortalecem o Brasil, o país tem, por outro lado, uma enorme dívida social que ameaça crescer e cujo enfrentamento é dificultado pela encruzilhada fiscal. Que saídas o senhor vê?

 

Tooze: Sei que Bolsonaro, sob a pressão do Congresso, já avançou bastante no espaço fiscal que tinha na relação dívida/PIB e no teto constitucional de despesas para minimizar os efeitos da pandemia. E que isso limita as opções. Mas a história desses últimos 20 anos não dá para ser fatalista sobre a questão da desigualdade no Brasil. Tanto Bolsonaro quanto Lula mostraram como o Brasil é capaz de enfrentar os problemas de pobreza e desigualdade. Um teve uma abordagem mais conjuntural e o outro, mais estruturada. Ambas são dependentes dos recursos advindos das exportações e do boom de commodities.

 

Uma solução duradoura para o tema deveria vir das lições de ambas as experiências para fazer o dinheiro chegar nas mãos dos mais pobres. Não há nada de errado nisso, mas é preciso melhoria educacional capaz de abrir oportunidades para camadas mais desfavorecidas da população, reverter o viés racial da pobreza e fazer o empoderamento de gênero. Ok, mas onde se encontra espaço fiscal para isso? Aumentando as exportações o máximo que se puder e sentando para se discutir a estrutura de impostos. Se há uma preocupação orçamentária, são duas as saídas. Uma é o controle de gastos e a outra é a arrecadação de impostos. E aí é hora de decidir quem pagará a conta. E há maneiras de taxar que podem fazer do Brasil uma sociedade menos desigual.

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